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Primeiras Vezes


Dizem que os primeiros são sempre inesquecíveis. O primeiro beijo, primeiro emprego, primeiro carro, primeiro amor, primeiro grande desafio. Fato é que qualquer primeiro, tira-lhe da inércia da vida. É um salto rumo ao desconhecido. O beijo inaugural pode ser decepcionante, o primeiro emprego mais ainda, o carro pode dar P.T. e o primeiro amor resultar num coração partido. Na verdade, geralmente é assim que acontece, afinal, nunca estamos preparados para primeira vez. Para a segunda, treinamos um pouco mais. Corrigimos dali, ajustamos daqui. Em inglês existe até uma expressão que diz que a terceira vez é a certeira. Quando chegamos lá, já sabemos bem o que esperar.


Imagina quando alcançamos o milésimo beijo, o oitavo emprego, o décimo carro, o grande desafio número 50, precisa ser enorme mesmo! Vai ficando tudo mecânico, certinho demais, meio sem graça. Daí vêm as crises da meia-idade. Para mim, elas deveriam chamar-se crise das 10as vezes - ou do tédio. Quantos momentos da infância e adolescência lembramos? Quantos da vida adulta? Se nos permitíssemos mais primeiras vezes, certamente teríamos uma memória melhor.


A primeira vez é inimiga do hábito e criadora de consciência e presença. Lembra da primeira vez que dirigiu? Muita atenção a tudo. A questão é que o medo do novo, fruto das primeiras experiências fracassadas, vai assentando-se e conforme envelhecemos vamos deliberadamente evitando as primeiras vezes cada dia mais. Não é a toa que tem tanta gente querendo alcançar o topo do Everest ou pular de paraquedas. A vida pede emoção. Ser humano é experimentar a realidade material em que estamos inseridos e, quem sabe, algo que vá até além dela. Mas, não é necessário escalar a montanha mais alta do mundo, comprar uma moto, arrumar uma amante ou se jogar de aviões para ter uma primeira vez.


Primeiras vezes podem ser pequenas, como uma comida nova que se experimenta, ou um gênero literário que nunca se leu, um caminho nunca percorrido para o trabalho, uma cor que não se costuma vestir, uma nova competência como a costura, tricô, desenho, um instrumento que se desenvolva. Sair da zona de conforto, da zona de medo. Uma primeira vez também pode ser uma segunda vez feita sob uma nova perspectiva, como andar de patins depois de adulto, ou pular na piscina de bolinhas com o seu filho, ou fazer a receita da sua avó com um novo recheio.


Tenho o hábito de encher a minha vida de primeiras vezes. Pego-me sempre descobrindo novidades sobre mim do tipo: adoro pintar com tinta, mas não gosto de colorir (hoje pelo menos, quem sabe daqui a alguns anos, quando eu tentar de novo pela primeira vez).

Gosto de desenhar mandalas, de fazer bolos, artesanato, de andar de patinete. Coisas que não sabia há três anos. Aprendemos que estamos sempre mudando, evoluindo. Percebemos as nossas resistências e talentos muitas vezes escondidos pela cultura e realidade em que estamos inseridos. Primeiras vezes são excitantes e inesquecíveis, assim como a vida deveria ser.

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Sou Andréia CC Mariano, escritora, educadora, filósofa, yogi, mãe, mulher, brasileira e portuguesa. Cidadã do mundo e amante das artes.

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