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Do papel à nuvem


Se antes a preocupação do escritor era que seus textos ficassem para sempre esquecidos em gavetas, seu temor atual é de que as suas obras sejam relegadas à nuvem, destinadas a flutuar eternamente entre zeros e uns.



Ultrapassada a fase de disquetes e armazenamento local em HD, A Nuvem parece um lugar seguro para eternização das palavras. Quantos manuscritos (que não foram escritos à mão) nossos descendentes encontrarão no dia derradeiro da faxina do drive? Quantos serão simplesmente abandonados, protegidos por senhas desconhecidas e sistemas de segurança em três etapas. Ficarão como minúsculas partículas de água em estado semi-condensado, arrastadas pelo vento do acaso, ansiando o momento da precipitação.



Este estado de não-ser que torna os originais não publicados ainda mais nebulosos do que sua contraparte concretizada em pilhas espessas de papel é quase como o prenúncio de um amanhecer que nunca chega para o escritor que espera algum dia ser lido. A ânsia de materialização de seu trabalho, causa, por vezes, um elevado investimento energético e financeiro do próprio escritor no sentido de garantir que sua criação venha ao mundo e encerre, finalmente, o ciclo de eterna gestação.



Confesso que sou do tipo que tem pressa de parir. Aliás, meu Áries em Marte, me causa muita ansiedade para tudo. Entretanto, quando o assunto é publicar a qualquer custo, sinto-me arrebatada de uma desconhecida serenidade. Talvez porque pense que as curtas publicações que faço na internet já possam surtir um impacto, ainda que efêmero, em algum desconhecido leitor em um momento de sincronicidade; ou, porque saiba que o escrever em si, já é para mim fonte inesgotável de boa-venturança; ou, ainda, porque acredite que não tenho nada a dizer que não possa ser dito por outros de forma melhor articulada, mais bela ou sábia, e que se um dia atingir esse patamar, a publicação seja natural e inevitável; ou, ao menos, porque no fundo tenha a esperança de que tendo dois filhos (nascidos de cesáreas em 40 semanas), detentores do conhecimento de todas as minhas senhas, aventurar-se-ão pelo meu computador quando eu não estiver mais aqui.


Posso quase ver o sorriso no canto de seus já enrugados lábios ao (depois de inserirem a senha, confirmarem que não são robôs, digitarem o código de confirmação no celular, e aceitarem o acesso do novo dispositivo) constatarem que sua mãe deixou as nuvens repletas de raios solares, arco-íris e estrelas.


Essa imagem basta para pacificar meu coração.


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Sou Andréia CC Mariano, escritora, educadora, filósofa, yogi, mãe, mulher, brasileira e portuguesa. Cidadã do mundo e amante das artes.

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